terça-feira, 8 de maio de 2007

Histórias Ouvidas no Terreiro do Tamanduá I

Tamanduá, como todos sabem, é o nome de um animal esquisito, da língua comprida, que vive papando as formigas e que é o terror dos cupins. Mas não é dele que vou contar. Vou contar de uma fazenda velha. Nenhuma semelhança com as "fazendas" de quem mora na cidade. Era fazenda com casa de adobe, piso de ladrilho, varanda com peitoril, terreiro grande e varrido, fogão à lenha, lamparina. Redes pelos quartos e pela varanda. Paiol para guardar o legume, aprisco para as cabras, curral para as vacas. Com uma árvore grande no terreiro para dar sombra de dia e atrair as assombrações de noite.
Essa fazenda tinha o nome de Tamanduá. Era um dos lugares mais isolados do mundo. Na época em que havia gente morando lá, quando se ouvia barulho de carro, uma vez no ano, no máximo, aquilo era um acontecimento. Também não havia estrada, nem caminho que pudesse ser construído. Nunca vi lugar ter mais pedras no caminho.
A vantagem é que a vida lá continua rural, pastoril. Não há luz elétrica, água encanada. O estreito caminho se ematou. A casa está abandonada! Só as cabras insistem em habitá-la. Tomam-lhe de conta os fantasmas.
À noite, ouvia-se muitas histórias no terreiro do Tamanduá. Sentávamos debaixo da árvore em nossas cadeiras feitas de couro de boi, acendíamos uma fogueira para espantar os muruim, que eram as piores assombrações. O urutau cantava:
- Flor, flor, flor!
- Mamãe, por que aquele passarinho canta assim? - Perguntava Maria, a menina mais nova,
que tinha seis anos.
- Ah! Aquele passarinho é a mãe da lua. Ela canta chamando o esposo dela. O nome dele é Flor.
- E ele não responde?
- Não. Ele partiu. Ele a abandonou. Sumiu no mundo e nunca mais ninguém o viu.
- Que pai ruim! Como pôde fazer isso?! Mesmo tendo uma filha tão bonita e tão famosa! Mesmo assim, abandonou a mãe. - Maria Lastimou.
- Aposto que arranjou outra! - Completou Tasso, em tom irônico, o filho mais velho.
- Mamãe, por que será que ela não pára de chamar por ele? - Continou a menina.
- Porque ela não sabe que ele não vai voltar.
- É a esperança! A tal esperança que a faz cantar. - Meteu-se a mais velha entre as meninas, que esquentava as mãos na fogueira.
- A esperança é boa, filha. Assim, ela tem motivos para cantar. - Ensinou a mãe.
- Para mim, ela chora. E esse marido dela fez escola porque agora tem um monte de homem largando a mulher e indo embora. - Completou a filha mais velha, pensando no seu pai que há muito tempo havia partido.
O urutau também quis participar e encerrou aquela discussão lamentando:
- Flor, Flor, Flor...

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