"Imagina, coração, eu, 20 anos na Papuda".
Eu vi o homem segurando um papelão, onde estava escrito esse apelo em letras garrafais. Ele estava no semáforo, exposto moralmente ao sol escaldante do meio-dia, como se continuasse a expiar a sua pena. As rugas banhavam seu rosto assim como as bagas de suor. Porém, os seus olhos denotavam que ele ainda tinha muitos degraus para subir até a velhice.
Observei que ele era muito esguio. Nada da barriguinha acentuada que em geral têm os homens livres. Não me recordo se ele tinha cabelos brancos. Provavelmente não os possuía.
Ele estendeu aquela "faixa" para mim e me olhou com certa reverência. Havia mais palavras escritas no papelão, mas não deu tempo de ler.
Procurei umas moedas. Não, umas moedas seria um desrespeito. Dei-lhe uma cédula. Era de pouco valor, mas era uma cédula.
Ele me agradeceu em nome de Deus e partiu. Como não deu tempo de perguntar-lhe o nome, nem como era Deus, apelidei-o de Esmeraldo.
Agora ele está no seu encalço, como um fantasma, querendo contar-me a sua vida desgraçada, falar de suas misérias, de suas alegrias, de suas farras. Eu digo para ele:
- Paciência, Esmeraldo! Não me assusta, cara, que vinte anos na cadeia não é mole não. Vai ter que alugar meus ouvidos um bocado. Acalma-te, que minhas orelhas já estão esquentando.
quinta-feira, 17 de maio de 2007
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