quarta-feira, 4 de abril de 2007

O dia em que segurei um anjo no colo

Eu gostaria de contar esta história para um rapaz que me escreveu chamando-me "mulher-anjo". Ele me escreveu o seguinte: "Eu vi a mulher-anjo! E ela..." E completou dizendo que gostaria de estar do lado de sua filha para vê-la enrubescer quando lhe contasse que viu a "mulher-anjo". Mas eu tenho ciência que não pertenço a essa categoria de seres superiores.
Mas hj me foi dada a oportunidade de ter um anjo no colo e vivi um dos momentos mais emocionantes de minha vida.
Infelizmente, por trás dessa emoção, há uma história triste.
Era uma e meia da tarde de hoje, o sol estava a pino, o asfalto do estacionamento exalava calor, quando avistei uma multidão reunida em torno de um carro. Curiosa como sou, (não há etiqueta que reprima a minha curiosidade, ainda bem), eu fui verificar o que era. Juntei-me aos muitos que estavam ali e fui logo perguntando para o primeiro que encontrei:
- O que aconteceu?
- Duas crianças estão presas neste carro desde esta manhã!
Meu coração deu um salto, aproximei-me do carro, que, além de preto, tinha o vidro escuro, e vi as duas crianças lá dentro. Um menininho sentado na sua cadeira e do outro lado um bebê que mal dava para ser visto. O menininho me avistou e atirou suas mãozinhas para minha direção. Até hj ninguém dirigiu para mim um apelo mais pungente.
De repente, vi que havia policiais armados e que todos gritavam: arromba a porta, arromba.
Do outro lado, havia um homem, que eu não sabia quem era, que pedia calma, que pedia pra esperar que a chave estava chegando, não sei o que mais...
Uma fúria tomou conta de mim e eu investi com palavras contra esse homem. Protestei que as crianças tinham que ser socorridas imediatamente, que ele não podia contrariar a autoridade policial. O homem se virou para mim e disse:
- Cala a boca! Vc não sabe com quem está falando!
Eu fiquei mais furiosa e toda a multidão se juntou a mim para me proteger, pois o homem estava descontrolado.
O homem não queria que quebrasse o vidro do carro. E a maior surpresa estava por vir. Realmente eu não sabia com quem falava, jamais imaginei com quem falava.
Quando eu soube da identidade do homem veio o verdadeiro choque: ele era o pai das crianças!
Como podia ser ele o pai?!Todos se olhavam com esta pergunta nos olhos. Como podia estar preocupado em não estragar o seu carro!
Um homem que guarda os carros no estacionamento, vendo que os policiais hesitavam, apresentou-se com uma pedra imensa e declarou:
- Se vocês, policiais, não quebram o vidro, eu arrebento esta porta agora.
No mesmo instante, ouviu-se um estampido e o policial rompeu a fechadura da porta.
- Pronto! - Alguém gritou com alívio.
Eu estava bem perto do carro, libertei o menininho do cinto, e o tirei dali. Ele estava quente, molhado de suor, o rosto vermelhinho e cheio de bolhas, chorava, mas não tinha mais lágrimas. Agarrou-se ao meu pescoço com tanta ternura como se eu fosse a sua mãe. Do outro lado, estava o bebê de colo. A sua mãe o pegou, ele não esboçou reação.
O menininho que segurei devia ter uns dois anos, tinha os cabelos castanhos em forma de cachos. Era um anjo, tenho certeza.
Entreguei-o à sua mãe e saí dali com o coração cheio de lágrimas.
Sim, e o homem, que era o pai das crianças, saiu dali algemado.
Como disse Frei Beto: Tens o poder de ser o anjo ou o demônio da terra.
Então escolhe!

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